Sobre Demanda Espontânea – Parte II, por Edson Ramos

Edson Ramos
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Enfim nesse dia 28/08/19 foi publicado no diário oficial de Ilhéus o esperado resultado da análise do mérito das propostas culturais inscritas no edital Demanda Espontânea da Secretaria de Cultura e Turismo. Entre a publicação das propostas inscritas, nessa que foi a segunda chamada do edital, e o resultado de quais foram selecionadas, transcorreram-se exatos 03 meses. O que significam 02 meses de atraso de acordo com o cronograma previsto no edital. Mas, por outro lado, esse resultado, seguido da publicação das datas para as 03 chamadas subsequentes, manifesta uma intenção de continuidade das políticas de fomento a cultura em nível local; por meio do repasse de recursos do Fundo Municipal de Cultura à sociedade, mediante projetos. Dessa forma, das 12 propostas inscritas, 10 foram selecionadas pelo Comitê de Análise, totalizando o valor de R$ 41 mil; quer dizer, foram parcialmente selecionadas, já que tal como previa o edital “os valores aprovados foram inferiores aos apresentados na proposta”. O que significa que ações sociais nas mais diversas linguagens artísticas, deverão ter seus planos de execução achatados ou readequados aos valores aprovados, caso os proponentes assim concordem, do contrário, serão desclassificados. O que também já estava previamente previsto nos termos do edital tal como publicado em março de 2019.

Retoricamente questiono: é possível retornar a um local de onde nunca saímos? Quero dizer, ao se publicar um edital que disponibiliza R$200 mil reais de recursos públicos a serem repassados à sociedade em 05 chamadas distribuídas ao longo do ano, antes é necessário ter a perspectiva desse recurso para o Fundo Municipal de Cultura. Se não assim, estará criando um Frankstein com ares de bom moço. Ou algo do tipo. Dos ditos R$ 87 mil reais atualmente disponíveis no Fundo Municipal de Cultura, que se acredita suficientes para pagar as duas ou três primeiras chamadas desse certame público, só foram disponibilizados ao fundo municipal por repasse do governo do estado; como continuidade da lógica que orienta o Sistema Nacional de Cultura e que busca alinhar as diferentes instâncias públicas. Se não há o elo da gestão pública local, inevitavelmente temos um Fundo Municipal de Cultura capenga.

É sempre bom lembrar, da lei municipal 3.638, de 20/12/12, que em tese garante que 0,5% do orçamento público municipal anual, receita do IPTU e ISSQN, deve ser destinado ao Fundo Municipal de Cultura. Além da Lei 3.619 de 03/10/12 que institui o Plano Municipal de Cultura em Ilhéus, e que expressa na meta 42, como intenção: “o aumento em 1% dos recursos públicos para a cultura em relação ao orçamento municipal a cada 5 anos”. Porém, esses aparatos jurídicos formais caminham para o aniversário de 07 anos - entram e saem gestores públicos cujas remunerações são de fontes dos impostos dos cidadãos, especialmente os mais pobres - e esse samba enredo continua o mesmo. Nunca nenhum centavo contemplado nos planos plurianuais e nas leis orçamentárias do município foi destinado ao Fundo Municipal de Cultura, formalmente assumido como principal mecanismo de fomento às políticas culturais. Será que não estamos falando de mais de um milhão de reais que deveria compor esse fundo público, só nessa gestão mais recente?

Não bastasse essa fonte, recentemente foi divulgado o lançamento dos editais setoriais do Governo do Estado da Bahia, previsto para 09/09/19. Desde 2016 o governo da Bahia não lançava os editais setoriais, quando na ocasião foram disponibilizados mais de R$31 milhões de reais para o acesso da sociedade civil a recursos públicos para cultura via projetos. Em 2019 a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia disponibilizou R$ 20 milhões para o setor audiovisual, cujas inscrições encerraram em meados do ano. Além de R$ 1,2 milhão para o programa de Mobilidade Cultural. E ainda, o governo federal disponibilizou R$ 5 milhões para premiação de 250 iniciativas de culturas populares brasileiras, cujas inscrições encerram-se em agosto. Logo, existem recursos públicos para a cultura. E convém à Secretaria de Cultura e Turismo: ampliar e qualificar o DIÁLOGO com a sociedade local. Interpretar as políticas de fomento municipais como investimento possível em processos de formação técnica; como oportunidade de formalizar as demandas sociais em projetos sintonizados com as lógicas que orientam as Políticas Públicas Culturais. E assim, mobilizar esse potencial de construção coletiva de uma sociedade mais respeitosa e saudável. Não custa nada!

O autor Edson Ramos é Professor e Ativista Cultural. Mestre em Cultura e Sociedade pela UFBA e doutorando em Estudos Culturais pela UMinho. Integra a ação coletiva GuELA - Grupo Livre e Apartidário de Observação aos Direitos Culturais.