Monólogo da Faxineira de Ilusões II

Ana Virgínia Santiago
Divulgação

Retorno  à minha aldeia...

Sou Faxineira de Ilusões.

Precisei parar e (re)alimentar o espírito. Arrumar os pensamentos,  usar de artifícios poéticos para ultrapassar estações e fortalecer a minha essência...

Há momentos em que é necessário descansar...

Foi preciso o aguardar, conter a energia, diminuir movimentos, entorpecer a alma com descanso para observar da “toca” o inverno passar, apesar de ver as folhas ainda serem o milagre da queda e do renascimento.

Há momentos em que é necessário hibernar  para conseguir voltar.

 

Retorno à minha aldeia...

Após o período da espera, , do despertar para alimentar-me,  volto ao movimento dos passos de olhar, trabalhar, observar, enxergar, reconhecer e limpar.

Fechar os olhos, imaginar mudanças,abraçar querências.

E ,agarrando, como migalhas de esperança, as ilusões adormecidas ,bem adormecidas no fundo do coração, as coloco em total efervescência para   sobreviver e… voltar!

 

Sou Faxineira de Ilusões...

Mas como varrer os pensamentos de negação ao crescimento se  ainda reflito diante de fatos que me impuseram à hibernação?

Como entender indignos gestos diários para quem tem a sabedoria da vivência e armazena tantos ensinamentos?

Foi preciso parar diante da negligência, do desrespeito à saúde, aos mais velhos, aos novos que anseiam de amparo. Parar perante a ausência de olhares para o outro como seu semelhante. Constatei o caos invadindo as gentes da minha e de tantas aldeias, dimensionando  os valores distorcidos de pessoas que deveriam ser diferenciadas.

 

 

 

Sou Faxineira de Ilusões…

Mas como varrer, polir, limpar?

São muitas armadilhas (des)humanas, tantos erros, ambicões desenfreadas,tantas ações torpes… Como limpar, se são lixo que não se destroi , pois proliferam?

De que forma incinerar elementos que mancham a existência humana e percorrem corredores acarpetados lustrando palácios, atravessando oceanos, festejando a megalomania do querer mais,  todos, respaldados na vaidade efêmera, nos planos negros que se utilizam da casca podre de classes que deveriam ser exemplos?

Como encarar quem segura livros de salmos e cânticos de louvores, versos solidários e escondem o emporcalhamento das atitudes guardadas em acões subreptícias e que enxovalham quem preserva ensinamentos probos?

 

Sou Faxineira de Ilusões...

Preciso varrer, polir.  Necessito limpar o que a escória impede de realizer o meu trabalho. Sinto asco, mas preciso conviver para exercer a minha função...

Relutar, duelar.

Como aspergir essências de bem querer, alfazema e sândalo em passadas que dizimam e deixam rastros de enlouquecidos seres negativos que só querem denegrirr? 

Limpar espaços onde também pisam pessoas mascaradas, que continuam tecendo astutos olhares de malversão e de ânsia de poderes?

Por isso hibernei… adormeci aguardando a nova estação.

Para conter os gritos de desprezo para quem  desconhece a probidade com o bem púbico, ,para quem não enxergou todas as aldeias( ah! Pessoa!) como prioridade e se apega a letrinhas  e símbolos que sempre estão fazendo  a brincadeira da cadeira, mudando de  palanques,  desviando os trajetos das escadas. 

Passada a estacão que me acolheu e limpando o caminho impedido pelas folhas da “toca” que me abrigou, volto à minha aldeia e a vejo precisando  de novos olhares, de pessoas que pensem num todo, que esqueçam os miúdos projetos de competição e assimilem as histórias com quem convive e podem ensinar.

Sou Faxineira , preciso de ilusões, de quimeras e encantadores respingos de energia para poder trabalhar.