O misticismo do Natal e a necessidade de querer o impossível

Ana Virgínia Santiago
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E a essência do Natal , que já começa a tomar forma com o sentimento  que induz à  reflexão - mesmo que momentaneamente – estimula a Faxineira de Ilusões a dar uma pausa com as suas funções físicas e anímicas para apenas olhar, pensar e repensar.

E observou e tanto olhou e tanto perscrutou as pessoas de seu círculo vivencial que sentiu faltas, lacunas afetivas, ausências emocionais, saudades e atitudes novas  de pessoas chegadas.

E  analisou de tal maneira que sentiu temor pelo futuro, pelo que sua alma de pitonisa e consultora de oráculos e  que acredita nos astros, nos deuses e em esferas não vistas, alertou um desesperado alerta.

Então, seus olhares buscaram presenças e não as encontraram... Tentaram ouvir vozes e nas as ouviram.

E sentiu saudades imensas de uma guerreira que, leoa  apaziguada, protegeu seus filhos e os encaminhou para a vida. Uma mulher que se escondeu “por fórceps” e foi aniquilando a força, a luta e o labor de uma vida tão atribulada e cheia de energia.

Sentiu as saudades que doem demais pois não podem fazer mágica.

E buscou e não a encontrou. Quem a acompanha agora a guerreira que foi usurpada de seus pensamentos ordenados, do seu equilíbrio, da sua meta de seguir adiante com os próprios passos, impotente com as mãos que tanto trabalharam e precisaram  de outras para viver?

A essência do Natal, que já começa a tomar forma com o sentimento  que induz à  reflexão - mesmo que momentaneamente – começa a gritar no âmago da Faxineira e a faz repensar porque está com saudades da leoa apaziguada.

E como questiona por que se permitiu colocar as vendas para não enxergar o que era natural deixando de olhar, olhar, olhar e entender o ciclo vital daquela  mulher que protegeu seus filhos  até quando pode e os encaminhou para a vida.

Porque é Natal, a Faxineira olha e olha encontrando as lembranças que doem – porque saudosas - em cada canto que para, em cada  espaço que observa a beleza das cores vermelho , verde e ouro  inebriando a ânsia de querer mesmo para quem não tem permissão para as vontades específicas de uma época que se oferece tanto e nem sempre se pode adquirir.

Porque é Natal e a ansiedade de tocar, ver e sentir todos os seres que foram sempre indicadores de caminhos para a sua vida é  tão grande, que a Faxineira esqueceu a própria essência de visão apurada e não viu que havia mudanças  ao seu entorno.

Mais lacunas em cadeiras vazias, gestos conhecidos inexistentes, vozes e ou manias que não possuem ecos.

A vida mudou, muitas coisas adquiriram a posição de” ponta-cabeça” e um interminável  rosário de queixas e carências começam a permear os passos da Varredora de sonhos.

Tanto olhou e perscrutou as pessoas que viu modificações.

Como tudo mudou! Por que os olhares perderam o brilho e suplicam atenção? O que impediu que alguns deles não vissem o adiante?

A essência de uma data que é Natal abriu os horizontes anímicos da Faxineira que abraçou mais saudades. Saudades de um comandante que, contra a vontade, precisou  jogar a âncora ao mar. Um timoneiro que faz muita falta e, com a leoa apaziguada, passeiam por outras constelações.

Porque já é quase Natal e as pessoas sensíveis ficam mais vulneráveis, a Faxineira aguçou os seus sentidos para  encontrar infantes que sumiram de sua visão, homens e mulheres que se perderam do seu caminho, ouvindo lamentos tão  profundos que lhe inibem e formam labirintos impossíveis  de amparo.

Porque é quase Natal a Faxineira, imbuída de mais energia que dimensiona o seu olhar, está com a alma aberta para o espírito de recordações cristãs, busca mais seres , agora encantados  enfeitando os céus com as mãos cheias de estrelas...

Sente a realidade de suas recordações porque mesmo tendo o poder de sonhar tem a certeza de sua impotência. Não pode trazer para si quem ela quer porque, agora, são vizinhos de Centaurus e de Vênus e sobrevoam as plêiades, galáxias e nebulosas vivenciando a criação e chegam perto de Deus

 

Ela, a Faxineira de Ilusões, amparada na crença dos astros e oráculos fortalece o seu olhar de tantos amores e quereres sentindo um bálsamo tomando sua alma como propriedade. A quietude de sua consciência sai das entranhas para apaziguar suas saudades.

Tudo tem seu tempo chegado!

O tempo é o agente pacificador dos seus tormentos emocionais.

E Ela, Faxineira de Ilusões, recomeça o seu labor começando a aspirar as angústias, limpando ações desonestas que fazem mal, incinerando palavras que magoam. E torna a  sonhar, abraçar as quimeras que lhe alimentam, embalar lembranças que lhe fazem sorrir e fazer o reencontro de almas afins, porque o tempo é chegado e agente pacificador de tudo.

Então a Faxineira de Ilusões faz as pazes com o deus Hipnos, que lhe dá a companhia de seu filho Morfeu  e lhe propicia o reencontra  com o sono  para expandir seus sonhos…

Vai para o espaço ao encontro do Universo e brinca com as estrelas, descansa em Saturno e voa, voa bem  mais alto em condições de respirar a Via Láctea e, assim, encontrar as forças anímicas para retornar ao seu trabalho livre das ações que magoam, humilham, entristecem, preocupam, deturpam, causam espanto e fazem mal.

E a Faxineira inebria seu espírito de vontades benfazejas, de querências imortais, de sentimentos imutáveis e voa no espaço brincando com os seres celestes numa festa solitária mas, proveitosa, porque aterrisará em sua aldeia, totalmente encantada de luz, porque já é quase Natal.

A autora Ana Virgínia Santiago é jornalista, escritora, poeta e contista no sul da Bahia